A ação do homem só tem sentido se for compromissada com a realidade, uma vez que, diferente do animal, o ser humano é capaz de reflexão. O homem existe. Está inserido no mundo. Toma conhecimento deste mundo, sendo até capaz de modifica-lo. Esta ação modificadora, entretanto, torna-se impossível, se ele estiver imerso e acomodado a este mundo e for incapaz de distanciar-se dele para admira-lo e perceber o seu conjunto. Daí, a necessidade que tem o homem de contínua coexistência do “viver a realidade” com o “distanciar-se dela para refleti-la”, a fim de que possa, realmente, assumir seu compromisso. Isto é consciência crítica. E é, a partir desta visão crítica de realidade, que o homem se torna capaz de modificar o mundo em que vive. Ao contrário, a consciência ingênua leva a uma visão distorcida da realidade.
CARACTERÍSTICAS DA CONSCIÊNCIA INGÊNUA
Revela uma certa simplicidade, tendente a um simplismo na interpretação dos problemas, isto é, encara um desafio de maneira simplista.
Não se aprofunda na causalidade do próprio fato. Suas conclusões são apressadas, superficiais. É impermeável à investigação. Satisfaz-se com as aparências. Toda concepção científica para ele é um jogo de palavras.
Há também uma tendência a considerar que o passado foi melhor. Por exemplo: os pais que se queixam da conduta de seus filhos, comparando-a ao que faziam quando jovens.
Tende a aceitar formas gregárias ou massificadoras de comportamento. Esta tendência pode levar a uma consciência fanática.
Subestima o homem simples. Suas explicações são mágicas. É frágil na discussão dos problemas. O ingênuo parte do princípio que sabe tudo.
Pretende ganhar a discussão com argumentos frágeis. É polêmico, não pretende esclarecer. Suas discussão é feita mais de emocionalidades de que de criticidades: não procura a verdade; trata de impô-la e procurar meios históricos para convencer com suas idéias. É curioso ver como os ouvintes se deixam levar pela manha, pelos gestos e pelo palavreado. Trata de brigar mais, para ganhar mais. Tem forte conteúdo passional.
Pode cair no fanatismo ou sectarismo. Apresenta fortes compreensões mágicas. Diz que a realidade é estática e não mutável.
CARACTERÍSTICAS DA CONSCIÊNCIA CRÍTICA
Anseio de profundidade na análise de problemas. Não se satisfaz com as aparências.
Pode-se reconhecer desprovida de meios para a análise do problema. Reconhece que a realidade é mutável.
Substitui situações ou explicações mágicas por princípios autênticos de causalidade. Procura verificar ou testar as descobertas. Está sempre disposta a revisão.
Ao se deparar com um fato, faz o possível para livrar-se de preconceitos. Não somente na captação, mas também na análise e na resposta.
Repele posições quietistas. É intensamente inquieta. Torna-se mais crítica quanto mais reconhece em sua quietude a inquietude, e vice-versa.
Sabe que é na medida em que é e não pelo que parece. O essencial para parecer algo é ser algo; é a base da autenticidade.
Repele toda transferência de responsabilidade e de autoridade e aceita a delegação das mesmas. É indagadora, investiga, força, choca. Ama o diálogo, nutre-se dele.
Face ao novo, não repele o velho por ser velho, nem aceita o novo por ser novo, mas aceita-os na medida em que são válidos.
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. 6ª ed., Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1983.
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